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26/05/2021 - Notícias depois da mesa de abertura

 

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Caminhos para as políticas públicas com enfoque territorial

Pesquisadores destacam a relação cidade-campo, articulação dos instrumentos de planejamento e governabilidade sólida e inclusiva

 

De sua casa, na Colômbia, o professor Juan Patrício Molina se conecta em uma sala digital com a professora Betty Rocha, no Rio de Janeiro, Brasil. No ambiente online também estão o professor Javier Delgadillo, de Cuernavaca, no México, e Luciana Travassos, em São Paulo.

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O motivo da conexão em rede dos cientistas é a busca por respostas para a pergunta: quais os caminhos para o desenho e implementação de uma nova geração de políticas públicas com enfoque territorial?, tema da mesa 01 do II Seminário Internacional e IV Jornada da Agricultura Familiar, que aconteceu no dia 26 de maio.

 

Sob a moderação de Betty Rocha, professora e pesquisadora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e da Rede Brasileira de Pesquisa e Gestão em Desenvolvimento Territorial (Rete Brasil), os pesquisadores Javier Delgadillo, Luciana Travassos e Juan Patrício Molina apresentaram suas reflexões.

 

A integração regional a partir de cidades intermediárias e territórios Rurais

 

Javier Delgadillo, professor e pesquisador da Universidade Nacional Autônoma do México e da Rede Gestão Territorial para o Desenvolvimento Rural do México (UNAL-Rede GTD do México) destacou a importância das cidades intermediárias como meio e interface entre a relação campo e cidade, fazendo uma defesa da territorialidade multifuncional.

 

“Partimos de uma ideia de que para chegar ao desenvolvimento das pessoas, a melhor via é o território”.

 

De acordo com o professor, a realidade dos territórios é composta por múltiplos elementos, entre eles a cultura, os hábitos, os processos cognitivos, os grupos sociais, e que tratar essas complexidades é o que ele considera de enfoque territorial aplicado à planificação dos territórios.

 

“Exercer a interação humana no espaço leva a essa territorialidade que podemos medir simbolicamente e expressar como herança histórico cultural e podemos apresentar como complexidades dos atores no sentido de identidade e no sentido de expressividade”, explica Delgadillo.

 

Ainda de acordo com ele, há uma relação cada vez mais estreita entre o rural e o urbano,                                mas, em termos de políticas públicas, o rural ainda se mantém subordinado ao urbano .

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“O discurso que se apresenta, sobretudo na América Latina, é um discurso de diálogo, de abertura no sentido de buscar esta relação campo-cidade, urbano-rural, mas na visão do urbano. Quando nós colocamos na dimensão do rural, muda o sentido da dimensão territorial. É esse trânsito que temos que fazer nas políticas com incidência territorial”, indicou.

 

O professor também explicou o conceito de intermédias, aquelas que ocupam um lugar relacional e funcional na rede territorial de um país. “Não é só isso, mas também sobre as bases e funções que desempenham os fluxos e interações rurais entre territórios urbanos e territórios rurais”.

 

Além da atenção para a integração regional a partir da relações campo-cidade pela mediação das cidades intermediárias, Delgadillo, elencou outros seis caminhos para as políticas públicas com enfoque territorial: pertencimento, desenvolvimento, governança, identidade, convívio e gestão.

 

“O território, para nós, não é meio para pensar em desenvolvimento. O território é um ato de desenvolvimento em si mesmo.”, conclui.

 

Articulação dos instrumentos de planejamento

 

Repensar e articular os instrumentos de planejamento territorial foi um caminho apresentado pela professora e pesquisadora Luciana Travassos, da Universidade Federal do ABC (UFABC) e da Rete Brasil, que destacou o Plano Diretor (PDE) e o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE).

 

De acordo com ela, no caso brasileiro, a Constituição Federal e os instrumentos de planejamento territorial não possuem articulação entre si, e nos fazem perceber o território a partir de setores. Como exemplo de instrumentos que não possuem articulação, ela citou o  Plano Diretor, Planos de Bacias, Planos de Desenvolvimento Urbano Integrado e Plano de Gestão Ambiental para Territórios de Terras Indígenas.

 

“Esse hall enorme de instrumentos de planejamento não se integram. Não há uma integração do conteúdo desses planos e muitas vezes há um conflito de competências entre esses vários instrumentos”, analisou.

 

Travassos destacou que o PDE e o ZEE são instrumentos de planejamento que definem os escopos e conteúdos sobre ordenamento do território, e explicou que o Plano Diretor apresenta insuficiências para o desenvolvimento rural, pois muitos deles desconsideram os modos de vida rural e vinculam ao agrário ou a áreas de proteção ambiental.

 

“O Plano Diretor, do jeito que está montado no Brasil, reflete justamente aquilo que o professor Javier estava falando antes, que é uma visão, na melhor das hipóteses, uma visão do rural a partir das cidades”. lembrou Travassos.

 

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Apesar disso, ela considera o PDE como um instrumento de planejamento capaz de fazer a articulação entre políticas públicas e desenvolvimento dos territórios rurais. Para tanto, considera que tal instrumento deve sair da perspectiva do urbano e avançar para a noção de território, incluindo instrumentos de proteção ambiental.

 

Sobre as ZEE, Travassos pontuou que é possível avançar criando um arcabouço legal e sistema de gestão. “Esse arcabouço legal precisa considerar esses aspectos multiescalares e intersetoriais e colocar ênfase nas microregiões”. Ela acrescentou que isso deve se somar aos instrumentos fundiários, jurídicos e políticos de indução ao desenvolvimento territorial e proteção ambiental, além da cooperação territorial e ampliação da participação de órgãos colegiados.

 

A pesquisadora concluiu a sua apresentação levantando três questões para o desenvolvimento dos territórios rurais: necessidade de articulação entre instrumentos de planejamento territorial, as políticas públicas setoriais e os níveis de governo, levantamento de experiências inovadoras e interessantes em instrumentos existentes.

 

“Onde a gente  vai disputar o desenvolvimento dos territórios rurais no âmbito dos instrumentos já existentes? Pensar que muitos desses instrumentos foram feitos a partir de lógicas que não levavam em conta o desenvolvimento rural, pensar como e onde a gente vai fazer essas disputa, como a gente vai constituir ou inserir dentro desses instrumentos uma compreensão melhor do papel dos territórios rurais para o desenvolvimento integral dos territórios”, concluiu.

 

Betty Rocha acrescentou falando sobre a perspectiva dos consórcios como uma saída e destacou a importância da academia, da produção acadêmica e o diálogo com as universidades dentro desse processo.

 

Governabilidade sólida e inclusiva

 

Rodeado de livros, o professor da Universidade Nacional da Colômbia, Juan Patrício Molina apresentou a governabilidade como um dos caminhos pelos quais as políticas públicas com enfoque territorial devem seguir.

 

“Se quer ser coerente com a questão do enfoque territorial para o desenvolvimento, a governabilidade deve ser sólida, inclusiva, e deveria, portanto, ser compartilhada com a sociedade civil”, ponderou.

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Molina citou o exemplo de enfoque de bacias hidrográficas para o manejo da água como um dos mais adequados para as políticas públicas para o manejo ambiental. Ele também considerou que os critérios técnicos não são o suficiente, mas é indispensável o social. Ainda de acordo com ele, as políticas de gestão territorial são, em essência, processos de concentração que requerem instrumentalização e superação de desequilíbrios.

 

 “O desenho de políticas de gestão territorial requer ser analisado, afinado e renovado à luz das experiências que já temos”. O professor destacou que o desenvolvimento tecnológico com os instrumentos de gestão territorial é um campo fundamental no afinamento entre os instrumentos existentes e a criação de instrumentos tecnológicos.

 

Além da governabilidade, Molina elencou um ciclo de políticas que devem ter um enfoque territorial propriamente dito, entre elas, as políticas fiscais para que haja independência dos municípios em relação às esferas nacionais no recebimento de recursos, as políticas de uso do solo e emprego, sendo esse último considerado por ele uma chave no desenvolvimento territorial, o manejo de ambientes comuns e consolidação das rotas de governo e governabilidade.

 

O pesquisador disse que o Estado é fundamental para o enfoque territorial, e lembrou que há um problema de corrupção em todos os níveis, defendendo que “a gestão territorial para o desenvolvimento deve ser bandeirada pela defesa dos valores éticos frente ao mercado e ao Estado.”

 

Em sua fala, Molina, que também é coordenador da Rede Gestão Territorial para o Desenvolvimento Paz Colômbia (GTD-Paz-Colômbia) apresentou os objetivos da Red GTD Paz.

 

“Temos, então, um processo que tem afiando a aproximação aos temas e temos definido a partir dos aportes conceituais e metodológicos de incidência política e de inovações sociais que o papel da apropriação e autonomia dos territórios, os processos de governança são um tema fundamental de trabalho da Rede, o dos sistemas agroalimentares sustentáveis e abastecimento é um segundo tema que consideramos fundamental, a relevância dos estudos de paisagem e território e a prioridade da apropriação e uso de informações como diálogo e ação coletiva para gestão social do conhecimento e transformação produtiva”, elencou.

 

O coordenador também disse que a Red GTD Paz Colômbia tem vários desafios diante do cenário que vive a Colômbia, dos quais ele destaca dois

 

“Primeiro, que, como rede, é importante contribuir e fortalecer o diálogo amplo, inclusivo e honesto ao redor de temas estruturais e urgentes sobre desenvolvimento rural com enfoque territorial e nuclear. Em segundo lugar, os acordos de Paz firmados em 2017 como um foco prioritário de atenção. 

 

Desde abril, a Colômbia vive uma série de manifestações populares contra a violação de direitos humanos, a repressão policial e o governo de Ivan Duque. Em nota conjunta, a Rede Gestão Territorial para o Desenvolvimento Paz Colômbia (GTD -Paz), Rede Gestão Territorial para o Desenvolvimento Rural (Rede GTD do México) e Rede Brasileira de Pesquisa e Gestão em Desenvolvimento Territorial (RETE) repudiam a violação dos direitos humanos e solicitam ao presidente Ivan Duque que “detenha o grave processo de deterioração da democracia e das liberdades na Colômbia”.

 

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