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02/06/2021 - Notícias depois da mesa 2

 

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Integração de fatores, distribuição das feiras livres e inclusão tecnológica

Pesquisadores da França, Brasil e Portugal destacam os desafios das políticas locais e globais para a agricultura familiar e os sistemas agroalimentares

 

https://www.youtube.com/watch?v=hA4BCZJY_BM

 

“Cantar uma esperança e uma alegria” pela garantia do direito à vida plena, pela moradia, pelo direito à saúde, ao conhecimento, à alimentação. Com a poesia de Chico Buarque, cantada por integrantes do Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que teve início a segunda mesa do II Seminário Internacional e IV Jornada da Agricultura Familiar, realizada no último dia 02.

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Sob a moderação do professor José Paulo Pietrafesa, da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisador da Rede de Estudos Rurais, os palestrantes Ivan Tartaruga  (CEGOT) da Universidade do Porto (Portugal), Potira Preiss, pesquisadora na Universidade Santa Cruz do Sul (UNISC) e Rete Brasil e Eric Sabourin, pesquisador do Cirad, França apresentaram os desafios das políticas globais e locais para a agricultura familiar e os sistemas agroalimentares. 

 

Integração de fatores estruturais

 

O primeiro a fazer uso da palavra foi Eric Sabourin, pesquisador titular em antropologia e sociologia rural do centro de Coopération International en Recherche Agronomique pour le Développement (Cirad), de Montpellier, França. Ele falou sobre o desmonte de políticas públicas de agricultura familiar  e desenvolvimento rural no Brasil e demais paises do Mercosul.

 

Como exemplo brasileiro, Sabourin, que também é membro-fundador da Rede de Políticas Públicas e Desenvolvimento Rural na América Latina (PP-AL), apresentou o caso do desmonte da Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (PEAPO).

 

Em parceria com os pesquisadores Sérgio Leite, do Observatório de Políticas Públicas para Agricultura (OPPA) e Sérgio Sauer, da Rede de Estudos Rurais, Sabourin realizou uma análise a partir da sociologia da ação pública do desmonte de 11 políticas públicas estaduais e 2 políticas municipais de agroecologia e produção orgânica.

 

“Observamos trajetórias, ao mesmo tempo, de institucionalização dessas políticas em certos estados e municípios e desinstitucionalização em outros, como o Paraná, Minas Gerais, que foram estados pioneiros por conta da mudança de governo”, explicou Sabourin.

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Utilizando o quadro metodológico Policy Dismanting (Desmantelamento de Política), os pesquisadores identificaram que o desmantelamento por defeito, por mudança de arena, desmantelamento simbólico e desmantelamento ativo foram as principais estratégias utilizadas pelos gestores públicos para o desmonte do PEAPO nos estados e municípios analisados.

 

A pesquisa também analisou as reações da sociedade e organizações sociais diante do desmonte das políticas públicas. Entre os resultados identificados estavam a subsidiariedade das políticas estaduais e municipais, a resistência dos movimentos sociais, dos conselhos e colegiados territoriais, consórcio de governos do Nordeste e alternativas de financiamento internacionais.

 

Ainda de acordo com Sabourin, diferente do Brasil e Paraguai, países do Mercosul onde as mudanças de governos provocaram desmontes mais visíveis, na Argentina e Uruguaia as mudanças foram mais discretas. O investigador concluiu a sua apresentação dizendo que as análises de desmonte das políticas devem integrar os elementos estruturais a exemplo dos fatores externos e domésticos, os elementos cognitivos e o jogo de atores.

 

“Os jogos de atores que permitem, hoje, em particular, no caso de políticas de multiatores e multiníveis, deter uma visão mais global do conjunto de forças que interagem ou para promover, ou para resistir ou até para desmontar políticas públicas", concluiu.

 

Distribuição de feiras nos territórios

 

Dando sequência às apresentações, Potira Preiss,  pesquisadora pós-doc do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade de Santa Cruz do Sul, destacou que apesar de entendermos a necessidade de mudança dos sistemas alimentares, ainda estamos distantes “de conseguir chegar a implementar os planos que a gente tem feito à realidade que a gente gostaria”, disse.

 

A pesquisadora apresentou dados do Inquérito Nacional Sobre Insegurança Alimentar e Covir-19 no Brasil, organizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Pensan) que indica que 55% da população brasileira está em situação de insegurança alimentar.

 

Preiss destacou, ainda com base no Inquérito, que a insegurança alimentar atinge 65,2% da população rural, e que a fome é ainda mais grave nas áreas rurais, atingindo 14,3% de agricultores familiares.  "O que, de alguma forma, esse dado quer dizer, é que as pessoas que produzem comida, produzem alimentos, também estão passando fome”, analisou Press, que também é pesquisadora na Rede Brasileira de Pesquisa e Gestão em Desenvolvimento Territorial (Rete Brasil).

 

A pesquisadora também salientou a relevância da agricultura familiar para a redução dos efeitos das mudanças climáticas, para o processo de transição agroecológica, para a redução da pobreza e vulnerabilidade social. Apesar disso, ainda conforme Preiss, a agricultura familiar é um grupo social e político que tem sido preterido nos últimos anos em relação à agricultura patronal.

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Na sequência, Preiss também explicou que os sistemas alimentares convencionais estão ligados ao problema da insegurança alimentar pela oferta de produtos pouco nutritivos, das mudanças climáticas decorrentes das atividades agrícolas e das pandemias globais de doenças ocasionadas por hábitos alimentares inadequados.

 

“Nós precisamos sair de um sistema alimentar baseado em cadeias, em especial cadeias de valor, que tem como foco o lucro para construir um sistema  alimentar que seja muito mais complexo, multidimensional e que tenha um foco especial na necessidades humanas, que ele possa produzir um alimento que realmente alimente de fato a população, e que tenha práticas ambientais sustentáveis”, defendeu Press.

 

Doutora em desenvolvimento regional, Preiss apresentou resultados de suas pesquisas que analisaram a comercialização direta dos produtos da Agricultura Familiar em feiras de municípios do Rio Grande do Sul.

 

“A gente precisa de uma melhor distribuição das feiras nos territórios e a gente também precisa de uma priorização da agricultura familiar regional para realmente abastecer a população. Esses processos estariam realmente contribuindo para uma transição ecológica e valorização desses atores”, concluiu.

>> Ouça o podcast Segurança Alimentar, Agricultura Familiar e Políticas Públicas <<

 

Inclusão tecnológica nos mundos da alimentação

 

Ivan Tartaruga, investigador de Geografia Econômica e Social no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT) da Universidade do Porto (Portugal) falou sobre os usos inovadores de tecnologias digitais para o desenvolvimento dos territórios e sistemas agroalimentares.

 

O pesquisador citou o big data (banco de informações) como exemplo de tecnologia que tem sido aplicada nos sistemas agroalimentares, destacando empresas como a Google, Microsoft e IBM, além da Amazon e Alibaba como principais geradoras e distribuidoras dessa tecnologia.

 

"Essas grandes corporações geram grandes questões de concentração de poder e domínio que merece ser discutido”, alertou o pesquisador.

 

Esses recursos, ainda conforme Tartaruga, têm sido utilizados em mundos da alimentação, que de acordo com ele são compostos pelos mundos industrial, de mercado e de recursos intelectuais. Tartaruga salientou que o mundo dos recursos intelectuais associados à alimentação está vinculado à tecnologias digitais que estão mudando as estruturas de atividades econômicas produtivas e de consumo.

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Além dessas mudanças, o pesquisador também mencionou o uso de tecnologias digitais para o desenvolvimento de proteínas alternativas, o que, ainda de acordo com ele,  alguns autores têm chamado de comida ou alimentação como software. 

 

“Um tipo de alimentação proteica, basicamente carne, criados a partir de células ou materiais inorgânicos que geram alimentação", explicou Tartaruga, mencionando o Vale do Silício, nos Estados Unidos, Tel Aviv, em Israel e Singapura como exemplos de desenvolvimento tecnológico ligados à agricultura.

 

Outro mundo da alimentação destacado pelo professor é o interpessoal. Este, por sua vez, está relacionado a cadeias curtas de produção e distribuição de alimentos. “Temos uma produção de alimentos mais vinculada à agricultura orgânica ou alimentos típicos e regionais, vinculados a cadeias curtas e que tem uma grande possibilidade de desenvolvimento econômico e social vinculado a inovações incrementais e inovação inclusiva, que é nosso foco aqui, e muitas vezes vinculado a essas tecnologias digitais”, explicou

 

Tartaruga concluiu a sua apresentação defendendo o papel do estado para o fortalecimento da reestruturação econômica e tecnológica na direção de uma transição sustentável e dizendo que o grande desafio vinculado à digitalização e a necessidade de inclusão está relacionado com a apropriação tecnológica.

 

“A desigualdade de acesso a essas tecnologias, e aí nós temos toda a questão da brecha tecnológica, que nós vemos muito nos espaços rurais quando comparamos com os espaços urbanos. Então essa é uma brecha importante a ser solucionada”, concluiu o pesquisador.

 

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